terça-feira, 7 de março de 2017

AQUELA QUE FUI

Já hoje, por amanhã, Dia Internacional da Mulher

AQUELA QUE FUI
(Fabiana Esteves)

sou aquela que se encantou
pelo sorriso dele
sou aquela que se abriu em flor
pelo prazer dele
sou aquela que assumiu a culpa
pelo erro dele
sou aquela que nunca descansou
pelo sono dele
sou aquela que se empregou
pelo sustento dele
sou aquela que se calou
pela voz dele
sou aquela que se cobriu
pelo ciúme dele
sou aquela que se frustrou
pelo sonho dele
sou aquela que gritou
pelo direito dele
sou aquela que escondeu
a bebedeira dele
sou aquela que suportou
o tapa dele
que maquiou o hematoma
deixado por ele
SIM
sou aquela que fui
que apagou a chama do para sempre
e tomou de volta a sua alma
das mãos dele

SOU AQUELA QUE FUI

8 de março de 2017
Para todas as mulheres que sofrem ou sofreram violência. Não precisa ser para sempre.



domingo, 6 de novembro de 2016

Garoando

"Mãe tá garoando..." 
"E o que é garoando?"
"Tá pingando pequeno..."

Está garoando
Pingando pequeno
Miúdo 
Levinho
Feito gota de orvalho
Na folha de árvore
Na calçada 
Tem poça
Tem piscina de Polegarzinha
Recebendo bicadinhas
Caídas de nuvem
Está garoando
Pingando pequeno 
Miúdo 
Levinho 
Daqui de dentro
De grande 
Só a vontade de brincar
Lá fora
E a imaginação 
Que cresce 
Feito bolha de sabão


sexta-feira, 29 de abril de 2016

Transfigurada

Estava caminhando na praia e acordei agora, vinte anos depois. Transfigurada. As roupas não me cabem no corpo nem o amor no peito. Tal e qual Dona Doida de Adélia, com os joelhos de fora e sombrinha em punho. O fato de ser eu personagem me deu o poder de fazer milagres, daqueles do tipo brigadeiro de panela, pipoca com filme ou panqueca sem recheio. O povo me olha estranho, os homens não me desejam mais e desaprendi de fazer versos. A minha fé transborda o copo da salvação e não cabe na igreja. Vivo de catar gotas de orvalho. São o meu ganha pão. (que Deus me dê o pão, o pão da vida) Olho para os meus dedos e não encontro os anéis. Onde foram parar? Tenho filhos que não vi nascer, rugas que não vi crescer e dores que não vi brotar. Todo os dias me jogam n'água mas também desaprendi a nadar. Meus braços encurtaram e as pernas balbuciam. Só a areia que envolve o meu corpo não mudou. Ainda é a mesma de vinte anos atrás. Fina e limpa, do tipo que gruda na pele e não solta com o vento.