terça-feira, 14 de julho de 2015

Água quebrada

Lavar as panelas me reconciliou com a água fria. Estendi as roupas pretas e lavei os casacos do meu marido a fim de pegá-los para mim. Ele não sente frio, pensei. Os meus estão rasgados puídos, feios mesmo. Mas vou lavá-los depois para servir de dormir. Os pijamas estão caros, a energia elétrica... O combustível também. Tudo pela hora da morte. Lavei as panelas, mas o banho não encarei. Meu aquecedor está quebrado e o rapaz do conserto me deu conselho muito útil: compre outro. Mas sem grana não comprei. Ele agora só me dá água quebrada. Leio a Bíblia e lembro que há outros que nunca tiveram o prazer de um banho de água fumacenta, que embaça o basculante de tão quente. Pensei mas foi por pouco tempo. Precisava de águas e ideias quentes.  Sem chance. Dormi com as palavras gastas todas grudadas na pele.

quinta-feira, 2 de julho de 2015

INCONVENIENTES

Toda loja
Tem seus segredos
Bem guardados
No fundo de algum baú
Ou gaveta.
Nesta loja não.
Os segredos se guardam
Em livros
Ou sorrisos
Sempre
Abertos.
Inconvenientes toda vida
Os vendedores
Tem suas verdades
Estampadas no rosto.
Tem uma princesa
De óculos
Bochecha
E coração fofo.
Fofo mesmo, de nuvem.
Tem uma senhora
De cabelos grisalhos
Que nunca passa
Dos vinte anos.
Um palhaço
Que é poeta
nas horas livres.
Uma rainha
Que engoliu dois ovos
Cor de rosa
Uma Rapunzel
De muitas tranças...
Mas ninguém
Pode dizer
Que não há gavetas.
Só que elas servem
Para guardar
Os NOSSOS segredos.
É recheada
De vermelhos
Narizes
Para quem quiser
Brincar
De ser feliz
De vez em quando.